06/04/25
A Polícia Federal aponta que o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) utilizou recursos públicos destinados ao seu gabinete parlamentar para manter, em Goiânia, uma escola de inglês e uma loja de camisetas e acessórios de viés bolsonarista. Os dois empreendimentos funcionavam em um imóvel alugado com verba da Câmara dos Deputados e que deveria abrigar apenas um escritório político. O caso é investigado no âmbito da Operação Discalculia, deflagrada em outubro de 2024, que mira Gayer e seus assessores mais próximos.
Segundo a PF, o imóvel — cujo aluguel mensal de R$ 6,5 mil é pago com cota parlamentar — abrigava a escola e a loja, batizada de Desfazueli, registrada em nome do filho do deputado, mas que seria uma continuação das atividades antes exercidas sob a marca Bolsonarius. Além do aluguel, a Polícia Federal sustenta que funcionários pagos com recursos públicos atuavam nos empreendimentos particulares, o que configura desvio de finalidade.
“O parlamentar acaba por desequilibrar o ambiente concorrencial do setor, ante a matemática e objetiva posição de vantagem que se colocou”, anota a PF no inquérito, ressaltando que os custos com água, energia, internet e tributos estavam sendo absorvidos pela estrutura pública, em benefício de uma atividade privada.
De acordo com os investigadores, Gayer exercia papel ativo na operação das empresas. “Tinha postura de comando frente ao empreendimento, orientando a equipe e monitorando o desempenho das vendas, demonstrando um compromisso com o sucesso do negócio”, apontam os documentos. Em uma das mensagens interceptadas, Gayer orienta que camisetas e adesivos sejam levados para a escola.
A operação que investiga o caso foi batizada de Discalculia, em alusão a um erro de registro em uma organização social vinculada ao deputado, que constava com um quadro societário composto por crianças de 1 a 9 anos — indício de falsificação documental. O nome é uma ironia ao transtorno de aprendizagem ligado à dificuldade com números.
A PF afirma que Gayer é o “autor intelectual” de um esquema de desvio de recursos da cota parlamentar, inclusive por meio da criação dessa organização social com dados forjados.
Conversas encontradas no celular de João Paulo de Sousa Cavalcante, assessor de Gayer, reforçam a tese da Polícia Federal. Em diálogo com Marco Aurélio Nascimento, secretário parlamentar, João Paulo admite que “a escola está sendo paga com recurso público e tá sendo usada para um fim totalmente que tipo num existe né, num tem como ser assim”.
O assessor chega a demonstrar preocupação com a repercussão do caso: “Vai ser igual o caso daquela mulher do Popular na Assembleia... senhora, senhora, senhora. Num tem jeito vei o povo vai pra cima mesmo”, afirmou, em referência ao famoso meme criado em 2015, quando uma servidora pública foi flagrada saindo do trabalho após bater ponto, e fugiu da reportagem da TV Anhanguera.
Em outro trecho, João Paulo reconhece a fragilidade da situação do chefe: “O Gustavo hoje ele é uma vidraça, ele é um alvo, e se for pra cima moço, infelizmente a gente tá errando né. A gente tá pregando uma coisa e tá vivendo outra”.
João Paulo foi preso por suspeita de envolvimento nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro e é investigado por usar uma empresa de marketing para ocultar sua atuação como assessor parlamentar de fato, driblando vedações legais. Segundo a PF, ele recebeu R$ 24 mil em três parcelas de R$ 8 mil por meio da empresa, ao mesmo tempo em que gerenciava a agenda do deputado, contrariando os termos dos contratos firmados com a Câmara.
Nas redes sociais, Gustavo Gayer afirmou que a operação da PF teve motivações políticas. “Vieram na minha casa, levaram meu celular, meu HD. Essa democracia relativa está custando caro”, declarou. Segundo ele, a ação teve como objetivo interferir no processo eleitoral em Goiânia. “Foi feita dois dias antes do segundo turno da eleição, da qual meu candidato participa. Isso visa claramente prejudicá-lo”, disse.