25/05/25
A 26ª edição da Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, realizada entre os dias 19 e 22 de maio, serviu como termômetro político para o cenário que começa a se desenhar rumo às eleições de 2026. Com discursos críticos e manifestações explícitas de desagrado, prefeitos de todo o país vaiaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) três vezes durante sua fala — ao mesmo tempo em que aplaudiram governadores como Ronaldo Caiado (UB) e lideranças do Congresso Nacional.
A reação dos gestores municipais revelou mais do que simples insatisfação pontual: mostrou um novo arranjo de forças políticas no país. Antes altamente dependentes do Executivo federal, os prefeitos agora se apoiam majoritariamente em recursos oriundos de emendas parlamentares, o que lhes confere maior autonomia e reduz a necessidade de alinhamento político com o Palácio do Planalto.
“Essa mudança é fruto direto da consolidação das emendas como principal instrumento de transferência de recursos, que passou a ser controlado pelo Congresso”, analisam observadores do cenário político. O efeito é visível: em 2008, ainda sob a presidência de Lula, o PT elegeu 554 prefeitos e foi o partido com maior número de capitais. Já em 2024, esse número caiu para 252, com o partido quase ficando sem nenhuma capital — Fortaleza foi uma exceção apertada, com Evandro Leitão vencendo por 50,38% dos votos.
Historicamente, os municípios sempre enfrentaram desvantagens estruturais em relação aos governos estaduais e federal. São eles que lidam diretamente com os cidadãos, com maiores encargos em saúde, educação e serviços básicos — mas sem o mesmo protagonismo nos conselhos que definem os rumos dos recursos. Dependem de repasses como o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e de verbas carimbadas, que não permitem flexibilidade de aplicação.
O que mudou nos últimos anos foi a dinâmica orçamentária. Com o chamado "orçamento secreto" e a ampliação das emendas impositivas, prefeitos passaram a conquistar obras e investimentos com apoio direto de deputados e senadores, sem a necessidade de submissão ao Executivo federal. A Confederação Nacional de Municípios (CNM), por exemplo, passou a defender pautas antes inimagináveis — como maior protagonismo nos conselhos federais e no novo Conselho Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), previsto na Reforma Tributária.
Entre as principais demandas estão a aprovação da PEC da Sustentabilidade Fiscal (66/2023), que estende as regras da Reforma da Previdência para estados e municípios; a equiparação de benefícios dos regimes próprios de previdência ao modelo federal; e a possibilidade de as associações de municípios proporem Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs).
Lula
As vaias dirigidas ao presidente Lula na marcha foram interpretadas como um sinal claro de desalinhamento entre o Planalto e as demandas das bases municipais. Mais do que oposição ideológica, o embate revela uma fricção entre o projeto centralizador do governo federal e o atual espírito político do país, que aponta para a descentralização do poder.
Enquanto Lula defende a criação de sistemas unificados — como o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) — e aposta no protagonismo das estatais e do governo federal como motor do desenvolvimento, os prefeitos pedem autonomia e descentralização. A reforma tributária, ao centralizar a arrecadação para posterior redistribuição por um comitê gestor em Brasília, também gerou críticas.
“Os gestores não foram eleitos para receber mesada. Eles têm capacidade de gerar desenvolvimento e precisam de garantias constitucionais de autonomia, tanto na área econômica quanto na segurança. Não podemos permitir retrocessos”, disse Ronaldo Caiado, ovacionado ao defender maior autonomia fiscal para os entes federativos.
Comunicação
Outro fator de desgaste foi a falta de entrega prometida pelo governo. Prefeitos reclamam que o presidente afirmou que 2025 seria “o ano da colheita”, mas os frutos ainda não apareceram. Além disso, Lula se ausentou das disputas municipais em diversas capitais importantes, como Goiânia, deixando candidaturas aliadas isoladas e vulneráveis.
O resultado da marcha foi claro: os prefeitos não apenas querem mais recursos — querem mais voz e protagonismo. E, ao que tudo indica, quem entender isso primeiro poderá sair na frente na corrida presidencial de 2026.